Teodoro Isnard Ribeiro de Almeida
Depois de abordar as grandes mudanças climáticas no passado distante da Terra discute-se agora o clima no passado recente, até dezembro de 2023, um mês antes do momento em que escrevo.
– A gente lê em muitos lugares que a humanidade precisa deixar de jogar CO2 na atmosfera para impedir que a temperatura suba mais que 2oC em relação à temperatura na época da Revolução Industrial, que ocorreu em meados do século XIX. Como evoluiu a temperatura desde aquela época? E como está o CO2 hoje?
– Pois é, muitos líderes mundiais até falam de cuidarmos do planeta, mas na prática pouco mudou. E então a gente fica ainda mais preocupado. Hoje o CO2 na atmosfera está por volta de 425 ppm. Se a gente olhar para a última figura vamos ver que a maior concentração de CO2 na atmosfera dos últimos 800.000 anos foi há uns 320.000 anos e era de 300ppm, com a temperatura era uns 4oC acima da de hoje…
– Mas então a relação CO2 temperatura não está funcionando! Deveria estar muitos graus acima do que estamos vivendo!
– É verdade. A temperatura subiu pouco porque o planeta é muito grande e esse monte de CO2 foi jogado na atmosfera muito rapidamente. Isso que é assustador, a reação planetária é lenta, mas vai ocorrer. Mesmo que a concentração de CO2 ficasse estável a partir de agora a temperatura continuaria subindo por um longo tempo. E infelizmente o CO2 continua aumentando. E pensemos, se com 300ppm a temperatura estava 4oC acima da de hoje a gente pode esperar tempos muito muito quentes. Quem sabe repetir a temperatura estimada na maior das extinções em massa?
– Assustador! Deve haver dados detalhados da temperatura desde meados do século XIX. Como está evoluindo a temperatura?
– A temperatura já subiu um pouco, veja na figura seguinte. Parece que de 1850 até 1920 a temperatura variou como sempre, uns anos mais frios e outros mais quentes, mas não subiu. Aí de 1920 a 1940 subiu um pouco, estabilizou e de 1975 até hoje vem subindo muito rápido. 2023 foi o ano mais quente da série (1).
– Nossa, e as autoridades mundiais sabendo disso não fazem nada?
– Alguma coisa esses líderes fazem, mas é muito pouco. E há líderes que fazem ao contrário, estimulam o desmatamento da Amazônia, estimulam queimadas…
– Estamos fritos. Minha casa é na praia, o mar vai passar por cima da gente!
– Provavelmente vai. Mas demora um pouco. Eu, que tenho quase a idade de seu avô, acho que não vou ver isso. Mas meus netos vão ver água na rua de nossa casa em Paraty toda maré cheia de lua… Você provavelmente vai ter que mudar de casa… Agora me diga, os líderes de países, de empresas, não são adolescentes e nem muito jovens. Então eles não verão os tempos terríveis dessa tragédia anunciada.
– Ah, estou me lembrando daquele movimento de adolescentes que ocorreu há uns anos na Europa. Com a liderança de uma menina, Greta algo como Berg, ah, Greta Thunberg.
– Bem lembrado. O movimento “quintas-feiras pelo futuro” dizia: vocês não viverão a mudança climática, nós viveremos! O movimento ocorreu no mundo todo, sobretudo na Europa. Olhe esta foto com as adolescentes europeias protestando contra a passividade dos governantes: “in your hands is our future” (nas suas mãos está o nosso futuro)
– Mas será que o planeta não vai arranjar um jeito de com parar esse aumento de temperatura?
– Olha, pelo que eu sei é ao contrário: o gelo da Groelândia está derretendo e o gelo é branco, reflete a luz do Sol. As rochas são mais escuras, vão absorver a energia, aumentando ainda mais a temperatura. Outra coisa, no norte da Ásia os solos estão congelados há muitos milhares de anos, chamam-se “permafrost”. Se descongelarem vão jogar um monte de CO2 na atmosfera. E estão descongelando.
– A floresta amazônica, que agora está sendo mais preservada, não pode capturar esse excesso de CO2?
– Com o governo brasileiro eleito em 2022 o desmatamento diminuiu drasticamente, mas ainda há desmatamento. E quando a gente desmata não só deixa de capturar CO2 como joga ainda mais esse gás na atmosfera. No ano de 2021, ainda no período em que o governo brasileiro apoiava a destruição ambiental a Amazônia tornou-se uma emissora líquida de CO2 graças ao intenso desmatamento e às queimadas extensivas,
– Então a Amazônia naquele ano colocou mais CO2 na atmosfera do que capturou?
– Exato. E tem uma constatação recente que é muito assustadora: num estudo extensivo da temperatura das folhas de árvores na Amazônia e outras florestas tropicais, na estação seca de 2021, verificou-se que em curtos momentos foi atingida a temperatura-limite a partir das qual a clorofila passa a ser degradada e a folha morre. Se o processo for intenso e muitas folhas morrerem, morre a árvore. E se muitas árvores morrerem, morre a floresta. Esse estudo, publicado em junho de 2023 pela Nature, a mais prestigiosa revista científica, teve muito destaque na imprensa no exterior. Não vi nada na nossa imprensa.
Bom, a gente fala muito nas mudanças climáticas e cita a Amazônia. E nos climas mais frios o aquecimento global talvez fique até mais evidente, não?
– Eu acho que sim. Uma coisa evidente é a posição das geleiras, esses rios de gelo, que têm recuado em todo o mundo. Eu tive a oportunidade, em 2005, de constatar um recuo de uma geleira. Olhe, em 2005. Quase 20 anos atrás…
Recuo da Geleira Franz Joseph. A fotografia de 1867 foi fotografada de cartaz no Centro de Visitantes, na aldeia de Franz Joseph Glacier. A de 2005 é do autor e foi tirada mais ou menos no mesmo lugar. E tenho notícia de que depois de 2008 o recuo tem sido muito rápido e a frente da geleira está na seta vermelha.
(1) modificado de https://berkeleyearth.org/wp-content/uploads/2024/01/AnnualPlot-2023-1.png